domingo, 7 de novembro de 2010

Deu pro namoradinho?

Madalena dava pra todo mundo. Deu pro namoradinho, depois deu pro primo dele na festinha de natal. Madalena deu pro amigo do amigo, e viu que continuar aquele namoro não seria tão correto ou tão legal. Então ela disse adeus ao namoradinho, ao priminho ao amigo do amigo. Quando ela viu que estava livre deles, esqueceu do que se tratava a liberdade de verdade e viu que agora sim poderia dar pra quem quisesse. Deu até pra melhor amiga.

Balada, esquenta, carros, finais de semana na praia, dias de semana no cinema, banheiros, inferninhos, no sofá da sala. Madalena ficou até cansada. Madalena não tinha mais o que dar.

Um dia fizeram uma comunidade no orkut que se chamava “Pedra nela!”. Na descrição tava escrito: “Se você também é como nós, acha um absurdo a Madalena dar pra todos, ou se você conhece uma história zuada dessa mina, seja bem-vindo! Obs: se a Madalena já deu pra você, você também pode participar! Nós jogamos pedra, mesmo!”

A Madalena leu aquilo e tremeu por dentro. Mais do que tinha tremido na cama com qualquer um. E suou frio, mais do que havia transpirado em todos aqueles anos. Ninguém amava Madalena. Nem Madalena amava Madalena.

No meio dessa roda de acusações e pedras, apareceu um cara que não era da cidade. Talvez por isso ele não tinha pedras na mão nem queixas a fazer. Ou talvez, aquele cara fosse diferente dos outros. Fosse igual à ela. Não porque ele vivia num desequilíbrio total, mas porque ele também não aguentava mais ver as pessoas tomando decisões pelos outros. Ele achava chato ter que pensar na vida dos outros e condená-los. Ter que ter uma opinião sobre cada detalhe, sobre cada erro, sobre cada pessoa que errava. Ele sabia que se os pecados de cada pessoa fossem passados a limpo por elas mesmas, viver seria difícil demais, e seria uma chatice. Ele sabia que pensar no passado é pra quem depende dele, e que talvez essa não fosse a melhor opção para pessoas que buscassem mudar.

Talvez tenha sido por isso que as pessoas viraram pra ele e falaram “e então? tu não acha que a mina é a mais vaca de todas?” e ele sentiu um desânimo grande, que nem respondeu.

Fim das contas, você sabe como a história termina: ele disse “quem não tem pecado que atire a primeira pedra”, e ninguém foi capaz de atirá-las porque todos nós somos uns mentirosos, todos nós ladrões de alguma coisa ou até de nós mesmos. Todos nós somos orgulhosos e extremamente ganaciosos e queremos que o mundo gire ao redor da nossa idéia de mundo. Todos nós temos aquele erro que até hoje não esquecemos.

Por causa disso, a Madalena pode ir embora com a leveza de que todos somos pecadores, e por isso mesmo, todos somos livres para recomeçar.

Agora eu penso em mim, e em você. Talvez você não seja uma Madalena, talvez você não tenha dado até dizer chega. Mas quem sabe, você se deu pra coisas que afastaram você de você mesmo. Você se deu pra opiniões e deixou que elas ferissem você como pedras, como tiros, como morte.

Talvez você esteja numa maldita rodinha e já ache normal a sujeira que acompanha os seus passos, as pedras nas suas mãos. Talvez a sua vida seja mais dos outros do que sua, e talvez, você nunca tenha dado pra você mesmo. Uma chance, um recomeço, um esquecimento, um dia seguinte, um passo diferente, uma coragem de ser uma pessoa diferente, uma humildade de procurar na liberdade quem você realmente é.

Madalena foi embora e se a história não fala muito sobre ela, é porque ela descobriu coisas maiores do que as palavras.

Dizem que ela virou santa. Mas eu acho que não. A liberdade combina muito mais com os humanos e essa é a graça de ser imperfeito: sair de prisões a cada dia.

Madalena deu o coração.
*se você achou um absurdo o termo “dar” durante esse texto, não atire essas pedras. sejamos todos imperfeitos e felizes e unidos e mais livres do que as regras de linguagem.


Luciana Elaiuy – VIA

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