O que você faria no lugar dela? Não
duvido nada que você postaria no face:
“Homem de Deus que é homem de Deus
não ilude uma mulher.”
Ou então você contaria para muitas
pessoas da sua igreja, usando a situação como desculpa pra você virar um
desigrejado, afinal, não é assim que você está? Desigrejado?
Você conhece a sunamita? Então
tente-a imaginar como uma mulher distinta, rica e prendada.
Ah sim... Prendada.
Ela amava servir e fazer com que seu marido se sentisse bem em sua casa. Ela
era tão cheia de bondade, que pediu ao seu marido que a ajudasse a construir um
pequeno quarto de tijolos com uma cama, uma mesa, uma cadeira e uma lamparina
para que Eliseu se hospedasse ali todas as vezes que passasse por aquele povo.
Quanta gratidão no coração do
profeta Eliseu! Ele ficou encantado com todo aquele carinho e respeito, e
resolveu presentear aquela mulher. Seu marido já era velho, e ela não podia ter
filhos. Eliseu disse para a sunamita que ela teria um filho no próximo ano, e
ela respondeu tão prontamente quanto eu e você responderíamos quando a
esperança corre de nós a passos largos:
“Ah, meu Senhor! Não iluda a tua
serva...”
E no tempo que Eliseu determinou,
ela teve um filho.
Da hora, né? Criança traz uma
alegria, uma vontade de voltar a ser criança, desperta em nós um cuidado e um
reflexo que nem um jogador de futebol consegue desenvolver tão depressa.
Mas a criança morreu. Sim, a
criança morreu com fortes dores de cabeça enquanto ajudava o pai na lavoura.
A sunamita deitou a criança no
quarto que havia feito para Eliseu, montou em um jumento, e antes que
atravessasse o cercado de sua casa, encontrou o seu marido fazendo aquela cara
de “pra onde você pensa que vai?”. E ela respondeu “vai tudo bem”.
Ela foi sem olhar para os lados,
focada no monte Carmelo, onde estava Eliseu. Eliseu a viu de longe e pediu que
seu servo, Geazi, fosse encontra-la para saber se ia tudo bem com ela e a
família. Geazi encontrou e ela sequer parou para cumprimenta-lo, só o que
respondeu foi “vai tudo bem”.
Quantas vezes somos nós os
desaforados? Os que saem maldizendo a Deus e a todos porque as coisas não
saíram como convinham? Quantas vezes somos mimados e contamos toda a situação
para a primeira pessoa que nos pergunta qualquer coisa sem antes termos
conversado com quem realmente pode nos dar a direção?
Nunca contamos o nosso momento
desesperador para alguém sem maldizer nossas atitudes, as pessoas que nos
cercam e, muitas vezes, Deus e os seus planos. Pode ser o seu namoro,
casamento, diploma, faculdade, amizade, carro, seus pais, emprego, salário. No
caso da sunamita, meu caro, era um filho.
Não me espantaria se ela saísse
chorando, clamando aos céus por socorro, comovendo todo o seu povo a orar, as
mulheres da vila a cuidar do seu filho morto e preparar o funeral, e fosse pelo
caminho até o monte Carmelo chorando e gritando:
“EU NÃO PEDI ESSE FILHO, ELISEU.
AGORA RESOLVA MEU CORAÇÃO DILACERADO!”
Ela saiu calada, focada: ela queria
falar com o profeta. Somente o profeta poderia lhe responder as perguntas que
mais doíam em seu coração. Quando o
profeta avistou a sunamita, ele soube a tristeza que ela trazia consigo, as
lágrimas de amargura que ela ainda não tinha deixado que rolassem para que ela
não conseguisse se prostrar diante de Eliseu e dizer:
“Te pedi algum filho? Eu não disse:
Não me iluda? Olha agora como estou...”
Quase todas as vezes que você diz
que não Deus não te respondeu e que você está muito desanimado, você não levou
a Deus em oração o motivo de tanta preocupação. Nós somos seres tão
inconstantes, que pensamos que aquela conversa que tivemos com nosso amigo,
aquele desabafo, aquele atendimento com o líder da igreja foi o suficiente para
que Deus ficasse sabendo do que se passa em nós.
Nos momentos de maior desespero,
somos mal interpretados por quem cruza nosso caminho, afinal, não somos nós
quem pregamos as boas novas? Não fomos nós que subimos tantas vezes no altar
para levantar as mãos e dizer “Em tua graça estou satisfeito, Senhor”? Quem
pode entender nosso momento de maior desespero?
O mestre. O Rabi. Cristo.
Quando entendemos e aprendemos a
olhar e dizer “Vai tudo bem”, e focar no olhar do Mestre, conseguimos resolver
questões de maior conflito dentro de nós mesmos.
Quando deixamos de contar esses
problemas para quem não pode resolver, e esperamos para sermos atraídos e
cuidados pelo olhar do Mestre, algo dentro de nós renasce e desponta em forma
de esperança.
Em nossa vida com Cristo, estamos
sob um sol escaldante o tempo inteiro. A diferença é que Cristo nos reserva
fontes de água para refrigerar nossa alma durante todo o caminho – mas o sol
continua a queimar nossas cabeças. E nesse deserto aprendemos uma das mais
duras experiências: saber em quem podemos confiar.
Pra você, vai tudo bem comigo.
Diante de Cristo, eu deixo que as portas do meu coração se abram e a
sinceridade aponte para as feridas mais profundas que carrego, porque só assim
eu encontro refrigério nesse deserto de areia grossa que machuca meus pés, e de
sol escaldante que não me faz esquecer um minuto sequer que sou peregrino e
esse não é o meu lar.
Quanto à sunamita, ela teve o seu
filho de volta, e se prostrou novamente para adorar ao Senhor porque ela sabia
que tinha feito a coisa certa em procurar quem poderia resolver o seu problema.
Quando a nós, dentre todos esses
olhares que nos lançam, que possamos encontrar o olhar do Mestre e sermos
atraídos por ele. Que o mundo nos olhe e pense “Com ele vai tudo bem.”, que
Cristo nos olhe e sussurre “Não desista. Eu estou com você.”.
P.s: hoje eu acordei com uma música
que eu cantava com a minha mãe quanto eu tinha uns 3 anos. É capaz que muitos
de vocês nem conheçam, mas vale ler um trecho:
“Essa paz que eu sinto em minh ‘alma, não é porque tudo me vai bem. Essa
paz que eu sinto em minh ‘alma, é porque eu amo o meu Senhor. Não olhe as
circunstâncias, não, não, não. Olhe o seu amor, o seu grande amor. Não me guio
por vistas, alegre sou! E ainda que a terra não floresça, e a vide não dê o seu
fruto. E ainda que os montes se lancem ao mar, que a terra trema, hei de
confiar!”
Que essa seja a nossa oração.
Até quarta, gente! Se Deus quiser.
May Freire